Relembrar quem sou, ficar sempre saindo dos pensamentos intrusivos e me enxergar vivendo a minha vida do presente. A minha vida da vida inteira. Me ver bonita, me ver mulher, me ver querida, me ver inteligente, me ver amada. Sim, porque eu sou. Eu sou. Parar de me definir e de ver o mundo com uma única lente, a de uma criança que foi profundamente ferida. Uma criança que era livre e bonita e forte, e que passou a carregar o peso de uma pedra no meio do peito. Eu ainda carrego esta pedra, ganhei muita sabedoria sobre ela e através dela (através da dor). Estou profundamente cansada. Quando a instabilidade na saúde de painho se instala, consigo agir em tudo que é necessário, mas o preço é alto depois, mesmo ele ficando bem. É como uma espiral que se forma dentro de mim, uma força que me faz resolver o necessário com eficiência e destreza, então quando posso me acalmar um pouco, a espiral se desfaz formando uma grande onda que diz respeito só a mim. E de tanto resistir me sinto muito cansada, e os pensamentos disfuncionais ocupam espaço. Eu não sei para que serve isso, se é só para me derrubar (menti, sei que não se trata disso), é para eu me fazer levantar cada vez melhor, é uma repetição da força da pedra, como um treinador feroz me fazendo aprender a agir e reagir melhor. E eu espero fazer isso, estou fazendo, estou saindo do campo de cremação, hoje estou mais lúcida, chegou o momento de começar a voltar pra mim de novo, pra mim apenas, sem carregar os outros dentro de mim. Aqui deixo meu pai, aqui deixo a ansiedade e angústia de minha mãe, assim como o cansaço e a angústia repetitiva dela, aqui deixo a minha angústia repetitiva, aqui deixo a minha amiga com câncer, aqui deixo a necessidade de segurança falsa através de outra pessoa, aqui deixo o afastamento e a tristeza de outra amiga, aqui deixo minha mãe, aqui deixo a minha insegurança disfuncional, aqui deixo o medo hiper valorizado, aqui deixo o que não diz respeito apenas a mim. Aqui assumo o conhecimento de tudo que aprendi sobre a pedra. Aqui volto a preencher a minha base interior apenas comigo mesma.
Aqui volto a me preencher inteira de mim mesma, inteira apenas de mim mesma. Agora me ocupo apenas de mim mesma no presente.
Adulta, inteira, lúcida, com a sabedoria do aprendizado, sigo comigo em paz no presente, funcional, ativa e completamente com os pés na terra.
Agora antes das sete entrou na cozinha um aripuá, voou uns segundos na minha frente, oi meu amor, eu disse enquanto olhava, então ele foi embora. Em outros momentos da minha vida, exatamente quando a fresta surge pra voltar pra mim mesma, ele surge. Gosto dessa coincidência.
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